PODCAST 6 – Vozes da floresta fora da floresta: Josely Vianna Baptista, Sérgio Medeiros, André Vallias

Nada está fora do lugar. A frase parece nos remeter a um dos fragmentos de “Uma ciência do concreto”, de Claude Lévi-Strauss, onde ele afirmou que a ciência lida com dúvida e o fracasso, mas não com a desordem. Tudo tem está no seu devido lugar. O termo “fora”, no entanto, adquire um valor súbito que está no título “vozes da floresta fora da floresta”. Admite-se geograficamente a existência de um espaço exterior à floresta amazônica. Mas, tais vozes, por mais que sejam não-indígenas (Napë), estariam totalmente fora da floresta, ainda que esta floresta esteja muito mais circunscrita aos símbolos como insinuou um poeta? Nada está fora do lugar é o título de uma plaquete de Josely Vianna Baptista, editada pelo selo Demônio Negro, em São Paulo, em 2017.
“Você acha que caiu do céu e que eu saí de dentro da terra…” (p. 16). Essa é uma citação de O fim de tarde de uma alma com fome (2015), de Sérgio Medeiros (Mato Grosso, 1959). Trata-se de um poema dramático que tem por subtítulo “variações sobre um ou dois temas indígenas”. O livro apresenta três versões do diálogo de um jovem soldado com uma “alma” que pode ser um espírito, uma mulher ou uma anta. Os vocábulos alma e anta possuem não apenas uma afinidade lexical, mas abrem a dimensão semântica para a percepção xamânica. Isto é, de trânsito e participação entre mundos. Nunca está claro se o soldado ou se ambos estão mortos ou vivos.
O poema de André Vallias (São Paulo, 1963), Totem (2014), se inscreve nesta cartografia das vozes da floresta sobretudo pela dimensão gráfica-visual que revela um aspecto gramático-sensorial, nos quais os índios são índices sonoros. Nomes como Munduruku, Xavantes, Kaiowá, Yanomami, Marubo, enfim, nomes que fazem parte de um Brasil escondido e emudecido, o silêncio dos vencidos e a harmonia do mundo. Mas para citar Eduardo Viveiros de Castro que escreveu o prefácio: Os índios não são “nossos índios”. Eles não são “nossos”. Eles são nós. Nós somos eles. Todos nós somos todos eles. Somos outros, como todos.” Ou, em outro trecho da apresentação: nomes de povos, palavras estranhas, gramáticas misteriosas, sons inauditos, sílabas pedregosas mas também ditongos doces, palavras que escondem gentes e línguas de que sequer suspeitávamos os nomes. Nomes que mal sabemos, nomes que nunca ouvimos, mas vamos descobrindo. » É esse sentimento de descoberta que gostaria de deixar com esta leitura dos três autores.